domingo, 27 de fevereiro de 2011

Hoje, nos despedimos de Benedito Nunes

Não há o que dizer, somente o que lembrar e agradecer, pois o mundo e o Pará se despedem hoje do professor emérito, escritor e filósofo Benedito Nunes - Benedito José Viana da Costa Nunes *21.11.1929; + 27.02.2011 - que faleceu no Hospital Beneficente Portuguesa em Belém.
Ficarão, além da saudades, a história, a dedicação e a luta de Benedito durante 81 anos de vida e trajetória política e educacional.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

1ª Unidade Regional de Educação com nova Direção

Após a publicação no Diário Oficial do Estado do Pará (vide portarias abaixo), toma posse hoje, às 9h., na Sede Social do Rotary Club de Bragança, o Prof. Gleidson César Miranda Silva, no cargo de Diretor da 1ª Unidade Regional de Educação de Bragança, no governo de Simão Jatene (PSDB), substituindo a Prof.ª Nilza Maria Santiago Mesquita, dispensada da função, ainda remanescente do governo passado.
Gleidson Silva foi meu colega de aula desde muito tempo e parceiro de muitos trabalhos. É Licenciado Pleno em Pedagogia (UFPA) e exerceu várias funções na Rede de Educação entre Estado e Município. Foi Coordenador Pedagógico na EEEFM Luiz Paulino Mártires em parte do período de minha gestão como Diretor (2007-2009). É um dos proprietários do Liceu Vestibulares, onde também já trabalhei.
Com a sua posse, ele comprova o seu prestígio junto aos novos gestores do Estado e da SEDUC Pará e deve fazer uma gestão diferente da anterior. Ele deve modificar algumas estruturas do atendimento daquela unidade e, se bem o conheço, dedicar um cuidado maior com as Escolas nunca antes atendidas com respeito, imparcialidade e cordialidade.
Eu particularmente torço para que em sua gestão todas as Escolas (repito todas!) sejam atendidas com o mesmo empenho e dedicação, coisa que não se viu nas gestões anteriores da 1ª Unidade Regional de Educação de Bragança.
Parabéns, Prof. Gleidson Silva. Desejo sucesso e bons trabalhos.
Prof. M.Sc. Dário Benedito Rodrigues
Texto das portarias. Fonte: Site da Imprensa Oficial do Estado Pará.

DIÁRIO OFICIAL Nº. 31860 de 22/02/2011 SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO - CCC

PORTARIAS DIVERSAS Número de Publicação: 206186 Número de Publicação: 206119

DISPENSAR:

Portaria nº.: 1577/11 de 21/02/2011

Nome: NILZA MARIA SANTIAGO MESQUITA

Matrícula: 683698/1 – Tipo de Gratif.: GED-5 (Diretor)

Cargo/Lot.: Prof.AD-4/1ªURE/Bragança

Período: a partir de 21/02/2011.

DESIGNAR:

Portaria nº.: 1580/11 de 21/02/2011

Nome: GLEIDSON CESAR MIRANDA SILVA

Matrícula: 57176000/2 – Nível: GED-5 (Diretor)

Cargo/Lot.: Tec.Educação/1ª URE/Bragança

Período: a partir de 21/02/2011, até ulterior deliberação.

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

Seleção do Mestrado em Linguagens e Saberes na Amazônia (UFPA Campus de Bragança) publica homologações de inscrição

A Coordenação do Progama de Pós-Graduação em Linguagens e Saberes na Amazônia divulgou a relação das inscrições homologadas de candidatos ao Mestrado. Veja a lista dos inscritos que tiveram a sua homologação no link abaixo. Fonte: Site da UFPA

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Religião, política e negócios no Grão-Pará (Jornal Beira do Rio/UFPA)

Religião, política e negócios no Grão-Pará

Por: Vitor Ramon Gemaque

Foto: Manoel Neto

A colonização portuguesa trouxe diversos atores sociais para o Brasil e para o Pará. Além de colonos portugueses, vieram ordens de missionários católicos incumbidos de catequizar os indígenas e, posteriormente, vieram escravos negros da África para transformar a colônia em uma terra produtiva. Entre esses diversos atores, a Companhia de Jesus, cujos membros eram denominados de jesuítas ou inacianos, e o marquês de Pombal foram dois personagens históricos que influenciaram diretamente o processo de colonização no século XVIII.

O conflito entre a Companhia de Jesus e o Estado Português, representado pelo marquês de Pombal, levou ao rompimento das relações entre ambos e à expulsão da Ordem de Portugal e de todos os domínios portugueses em 1759. No Brasil, a expulsão teve início nos Estados do Grão-Pará e Maranhão de onde cinco jesuítas haviam sido expulsos ainda em 1755. A campanha movida por Pombal se espalhou por outros países europeus, como Espanha e França, de onde os jesuítas também foram expulsos, culminando, em 1773, com a extinção da Companhia de Jesus pelo Papa Clemente XIV.

Entender esse processo no cotidiano paraense da segunda metade do século XVIII foi o objetivo de José Alves de Souza Júnior, professor da Faculdade de História da Universidade Federal do Pará (UFPA), em sua Tese Tramas do Cotidiano: religião, política, guerra e negócios no Grão-Pará do setecentos. Um estudo sobre a Companhia de Jesus e a política pombalina. "Meu objetivo era tentar resgatar a atuação dos jesuítas no Grão-Pará, a partir da relação que a Ordem teve com o marquês de Pombal, a qual foi estremecendo a ponto de culminar com a expulsão", explica o professor.

A Companhia de Jesus teve grande influência na Corte Portuguesa nos reinados de Dom João IV e Dom João V. Um exemplo disso é o papel do padre jesuíta João Baptista Carbone, no reinado de João V, como conselheiro e confessor da família real, estando por trás das decisões da Corte.

Jesuítas acumulam patrimônio e ganham independência

A Ordem, que esteve à frente dos aldeamentos ou missões de catequização dos índios, acumulou um expressivo patrimônio material no Grão-Pará, com 448 fazendas, criação de gado, plantações de cacau, salsa e cravo para exportação e empréstimos de dinheiro a juros. Por meio dos aldeamentos, os jesuítas tinham a mão de obra indígena à disposição para todos os seus empreendimentos.

Segundo José Alves Júnior, isso aconteceu porque os jesuítas perceberam que o acordo feito entre a Igreja e o Estado Português para sustentar os padres e as missões de catequese não vingaria. A partir daí, a Companhia organizou o financiamento de seu empreendimento religioso com as riquezas que começou a acumular. "Eles conseguiram formar um expressivo patrimônio e ficaram independentes, tanto da coroa portuguesa quanto do papado", explica o professor.

No processo de colonização, foi constante o conflito entre os diferentes atores sociais que se relacionaram aqui. Jesuítas, colonos e outras ordens católicas disputavam a mão de obra indígena já que só se permitia a escravização dos índios inimigos, também chamados de gentios de corso, os quais não aceitavam a aproximação com os portugueses.

Enquanto os colonos portugueses criavam pretextos para escravizar os índios e usar seu trabalho na produção, os jesuítas pregavam a catequização do índio e a manutenção de sua "liberdade". Por vezes, os ânimos se acirraram devido às denúncias, da Companhia de Jesus, de escravizações ilegais dos índios pelos colonos. "Quanto mais índios estivessem nas mãos dos colonos, menor a possibilidade dos jesuítas concretizarem seu projeto salvacionista", ressalta José Alves.

A crescente resistência indígena foi outro fator importante no cotidiano das lutas na capitania. A união entre tribos inimigas, fugas e a oposição à catequese são exemplos disso.

Pombal extingue poder temporal de religiosos

Ao fugirem dos aldeamentos, os índios organizavam mocambos ou quilombos, onde também se refugiavam negros escravos fugitivos, mestiços e homens brancos, pobres desertores das tropas. Os mocambos tornavam-se espaços de socialização desse grande contingente de despossuídos. Essa nova identidade social – de oprimidos e explorados – está visível nas inúmeras rebeliões, como a Cabanagem.

A subida de Dom José I ao trono de Portugal e a nomeação do marquês de Pombal para a Secretaria da Guerra e de Negócios Estrangeiros reconfiguraram o poder em Portugal e no Grão-Pará. Este é um dos pontos centrais na pesquisa de José Alves. O historiador tenta demonstrar como foi a intervenção da metrópole portuguesa na Amazônia, no século XVIII, principalmente, no período em que Pombal esteve à frente da Secretaria e modificou profundamente as condições de vida e de trabalho de suas populações indígenas.

A nova política, conhecida por pombalina, tinha o objetivo de tornar o Estado laico, reduzindo a influência de religiosos no governo, além de tornar a Amazônia fonte de riqueza para a metrópole e reorganizar a colonização. Pombal criou a Companhia de Comércio do Grão-Pará e Maranhão, proibiu o trabalho escravo indígena e extinguiu o poder temporal dos religiosos nos aldeamentos.

Diante da restrição do poder missionário nos aldeamentos, os jesuítas começaram a sabotar o Projeto Pombalino, dificultando o acesso dos colonos e das autoridades coloniais à mão de obra indígena e criando obstáculos à demarcação dos limites estabelecidos pelo Tratado de Madri, assinado por Espanha e Portugal em 1750.

As dificuldades criadas ao governador do Estado do Grão-Pará e Maranhão, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, provocaram a expulsão dos primeiros jesuítas em 1755. Diante disso, os colonos portugueses se viram livre do maior empecilho à escravização indígena. Sem os missionários, a exploração dos índios aumentou na Amazônia.]

Prêmio Benedito Nunes

A Tese Tramas do Cotidiano ganhou a primeira edição do Prêmio Professor Benedito Nunes, sob a coordenação da Propesp. A premiação é bianual. Podem candidatar-se autores de teses de doutorado defendidas nos programas de pós-graduação dos Institutos de Ciências da Arte (ICA), de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) e de Letras e Comunicação (ILC) da UFPA, docentes ou técnico-administrativos que defenderam suas teses em programas de outras universidades reconhecidas pelo MEC, lotados nos institutos mencionados. Para José Alves, ganhar o Prêmio foi “uma grande felicidade”.

Fonte: BEIRA DO RIO. Jornal da Universidade Federal do Pará. Ano XXIV Nº 91, Fevereiro de 2011

Link: http://www.ufpa.br/beiradorio/novo/index.php/leia-tambem/122-edicao-91--fevereiro/1156-religiao-politica-e-negocios-no-grao-para

Legenda da Foto: Colégio e Igreja de Santo Alexandre foram sede da Companhia de Jesus em Belém.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Entrevista exclusiva com Dom Erwin Kräutler, bispo do Xingu

Entrevistei o bispo do Xingu, na oportunidade em que esteve em Bragança/PA, aceitando o convite das Irmãs Missionárias de Santa Teresinha, para pregar um seu retiro anual. A entrevista foi articulada com antecedência por mim e pelas irmãs Margarida Pantoja e Cilene Miranda. Dom Erwin me recebeu no final da manhã de 02 de fevereiro, no Sitio Nossa Senhora da Glória e aceitou falar sobre assuntos relacionados à sua luta contra a construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, em Altamira/PA.

O bispo da Prelazia do Xingu falou ainda do processo que está acontecendo na cidade, das perspectivas de resistência à hidrelétrica, dos impactos ambientais, sociais e culturais de sua construção, a visão daqueles que pretendem construir Belo Monte e a divulgação de ideais equivocadas sobre o projeto, além de relatar com exclusividade os detalhes de sua trajetória episcopal, marcada pelo respeito e carinho do povo de Altamira e de como lida com as ameaças a sua própria vida.

Presenteei Dom Erwin Kräutler com uma cruz peitoral e com uma imagem de São Benedito, a qual agradeceu revelando-se devoto desse grandioso santo. Por razões de segurança, não posso transcrever os trechos dessa parte da entrevista.

Prof. Dário: Fale sobre a sua impressão do que está acontecendo e sobre essa recente chamada licença específica prévia de construção de Belo Monte na semana passada e quais as perspectivas de luta futura para resistência do movimento contra a usina hidrelétrica no Xingu? O que isso (licença) atingirá de fato o movimento de resistência?

Dom Erwin: A primeira coisa é que a licença prévia já foi dada em fevereiro do ano passado (2010). Também essa licença prévia implica em quarenta condicionantes, quer dizer, a obra só pode se tornar realidade quando quarenta condicionantes forem cumpridas. Por isso, a nossa surpresa, a nossa indignação e nossa revolta em relação a essa licença, que chamam de específica ou de parcial para a implantação do canteiro de obras. Primeiro, essa figura não existe na legislação ambiental brasileira. Não existe nada disso. Inventaram mais uma coisa contra os próprios parâmetros legais da legislação ambiental. O próprio Ministério Público Federal entrou com a contestação e estamos esperando a decisão do juiz. Mas tem que olhar como se chegou a isso. O IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente), naquele tempo, quando foi publicada a licença prévia era outro presidente, Messias é o nome dele. Depois ele renunciou ao cargo e foi exonerado. Chegou outro. Ele se demitiu há pouco tempo. Dizem que é por razões de ordem pessoal, o que ninguém acredita. Antes dele, também, antes da licença prévia, dois cientistas, dois membros do IBAMA, no campo mais cientifico, que dizer, não eram cargos políticos, eram cargos técnicos, eles também se demitiram. E tudo está relacionado a Belo Monte. E agora de repente, vem esse substituto ou interino, que por pressão do governo solta essa tal de licença especial ou parcial. Não é admissível. Isto é inadmissível. A não ser que se mude toda a legislação, mas essa legislação não foi mudada até hoje. Então não é razão ou motivo para nós largarmos essa luta, dizendo que agora nós vamos “ensacar a viola” e dizer “olhe aqui, tá resolvido” e “pronto”. Eles dizem, o próprio interino fala que só se trata de um “canteirinho” de obras. Sabe, de Brasília é muito fácil falar. Brasília é um planalto a mil metros acima do nível do mar e nós estamos aqui em Altamira sofrendo as consequências desse projeto megalomaníaco. Vai acontecer o que? Se realmente se implantar esse canteiro de obras, é o efeito dominó. Se implantar o canteiro, é lógico que não vão parar com isso. Então de antemão a gente já sabe, isso é só o início da coisa. Mas, uma vez implantado o canteiro de obras vão parar? Vão nada! Vão continuar do mesmo jeito. Depois, implantando-se Belo Monte, o próprio Lula falou, que ia ser apenas uma única represa, uma única barragem. Isso é uma falácia. Porque o Xingu – ele sempre se fala em 11.400 mega watts – não tem capacidade, não tem volume d’água o ano inteiro para fazer funcionar as turbinas. Então praticamente no pique ela vai produzir talvez 11.400 mega watts, mas terão talvez quatro meses ao ano, ou cinco que seja.

Prof. Dário: E a viabilidade econômica e energética? Existe?

Dom Erwin: Aí que a gente entra. Os cientistas hoje, que são cientistas de ponta, de renome nacional e internacional, já alertaram para isso. Belo Monte não é viável do ponto de vista ambiental, do ponto de vista social e do ponto de vista financeiro. Gastar e aplicar 30 bilhões de reais para uma hidrelétrica que só funciona alguns meses durante o ano é um desperdício louco de recursos, inclusive dos nossos impostos. Bem, em não se cumprir as condicionantes, então, de antemão, a gente deveria dizer que não se pode ir adiante. Mas uma vez eu digo, o efeito dominó é isso. Se faz o canteiro de obras, se aumenta a obra.

Prof. Dário: A represa?

Dom Erwin: E depois essa única represa, eu estava dizendo, é também uma falácia, porque não é possível, não rende. E então é muito fácil resolver o problema quando se faz mais uma represa, e mais outra e mais outra. E aí todo o Xingu é sacrificado e todas as áreas indígenas ao longo do Xingu, nas margens do Xingu, serão invadidas por água, inundadas com absoluta certeza. São áreas indígenas demarcadas e homologadas. Um verdadeiro golpe. “Ah... tem decreto, pode fazer uma”. Decreto que o presidente emana pode ser revogado por qualquer coisa. A Dilma pode dizer “olhe, naquele tempo nós pensamos assim, mas revogo as disposições em contrário”. E acabou-se o papo. E o Xingu todo está sacrificado então.

Prof. Dário: Quais são os encaminhamentos?

Dom Erwin: Em relação ao povo atingido, mesmo esse povo que seria atingido por esse tal de canteiro de obras, é menos povo que o que será atingido depois com a barragem, mesmo o lago artificial. Mas esse povo, vão colocar aonde? Ninguém sabe. Ninguém falou nisso.

Prof. Dário: Não tem um plano de remanejamento?

Dom Erwin: Nada, nada, nada. Depois remanejar colono, como é que vai fazer? Remanejar índio, a mesma coisa. Mas o colono, por exemplo, um agricultor, uma família que mora lá na grande volta do Xingu desde o tempo do bisavô, eles são acostumados com a roça, plantam milho, arroz, feijão e mandioca, vivem disso, tem a sua criação, tem porco, tem pato, tem galinha e, não vivem de luxo, mas vivem bem, nunca teve fome. Agora vai ser arrancado do seu habitat, de sua roça que ganhou de seus ancestrais. Vai ser colocado aonde? Ninguém responde. Certamente o plano é colocar eles numa casinha, uma gaiola daquelas que eles vão fazer. É uma gaiola, que não cabe uma família morar. Geralmente são famílias grandes que tem muitos filhos. E depois, nem um quintal que preste eles tem. De que esse moço, essa família, essa mulher, essa criançada vai sobreviver? De que? Ele não é professor, ele não é bancário, ele não é pedreiro, não é marceneiro, ele não tem nenhuma profissão liberal. A profissão dele é agricultor. Dela é agricultora. Então, são tirados compulsoriamente de seu habitat e jogados não sei onde. Isso é primeiro. A respeito desse canteiro de obras, dessa tal licença específica ou parcial. Mas a segunda coisa, que vai mais longe, isso já antes dessa licença. Até nas condicionantes, deveria ser feito o saneamento básico de toda a cidade. Nada foi feito. Nada. Outra coisa, pelos cálculos de cientistas, Altamira vai dobrar com o tiro de largada para a obra. E já está chegando gente. Já está chegando gente! Altamira aumentou nos últimos meses e nós estamos ultrapassando 100 mil pessoas (referindo-se à população de Altamira). E agora quando vê isso “agora vai sair, agora vai sair”, já se soltou fogos e o povo de tudo quanto é canto do Brasil, esse povo que está aí caçando emprego vai chegar lá, porque lá vai ganhar emprego. Vai multiplicar, senão vai duplicar, mas é quase isso. E Altamira não tem nem a infraestrutura necessária para atender a demanda do povo que está vivendo aí agora. Então? Como que vai ser? Vai ser um Apocalipse. E pela experiência de Porto Velho, que recebemos informações, lá também está desse jeito. Não sabe mais o que fazer. Tudo aumentou, criminalidade aumentou, prostituição aumentou, tudo, o pessoal está pasmo, está amedrontado, está apavorado. Mas está previsto nas condicionantes que “a gente vai sanar essa situação antes de começar”. Nada está feito. Então, nós estamos recebendo uma mentira atrás da outra. Os governos não estão “nem aí”.

Prof. Dário: E como fica com a construção de Belo Monte?

Dom Erwin: Altamira vai pro fundo. Agora. Depois vai inundar Altamira, vai inundar lá para onde se fala hoje na baixada. Então vira uma península. Ora, esse lago é um lago morto, é um lago podre. E os cientistas já disseram isso, dos vários gases que serão expelidos para esse lago pela vegetação que apodrece lá nos fundos.

Prof. Dário: E a memória da vida das pessoas, será colocada debaixo d’água?

Dom Erwin: Sim. Sim. Claro que não vão alagar as casas com as famílias dentro. Vão ter que transferir. Mas ninguém sabe até hoje pra onde. Ninguém sabe. O governo simplesmente se cala, o setor energético se cala. E não diz. São em torno de trinta mil pessoas serão diretamente atingidas. Não se sabe para onde vai esse povo. E o governo insiste que tem que sair para salvar o Brasil do apagão. E tudo é mentira. Primeiro, o que eles tem que prever é energia para o setor metalúrgico, para lingotes de alumínio, aproveitar a bauxita que eles tem aqui no Pará, então eles precisam de muita energia para a confecção de lingote. Mas é para isso. Belo Monte vai servir para isso e não para...

Prof. Dário: E não é para abastecer as comunidades?

Dom Erwin: Que nada. Isso é mentira! Estão falando até, ameaçando o brasileiro, “olha que se a gente não fizer Belo Monte, não vai poder assistir a novela das oito”, e pros sulistas se diz “olha seu banho vai ficar antigo, o chuveiro elétrico não funciona sem energia”...

Prof. Dário: Nesse contexto atual, nós temos a CNBB chamando atenção para a questão ambiental e para o respeito à natureza e à vida, através da Campanha da Fraternidade 2011. E o senhor vê uma relação de colaboração e de correspondência a essa questão de Belo Monte? E a Campanha da Fraternidade de 2011 pode suscitar um apelo formal da Igreja do Brasil ao povo brasileiro com relação a lutar pela não construção de Belo Monte?

Dom Erwin: Sem dúvida. Aliás, a CNBB Regional Norte II já fez uma parte. Nossa CNBB do Pará e do Amapá já se manifestou contra. Quando viram a luta que a gente está travando lá em Altamira, se manifestaram contra. A CNBB em nível nacional, a presidência assinou um documento manifestando-se contra mais essa agressão de destruição para a Amazônia. Então já foi feito. Mas a própria Campanha da Fraternidade é um momento privilegiado, um momento específico em que a gente trata desses assuntos. Nós não abrimos mão, nós não “penduramos a chuteira”, nós vamos continuar a lutar, sem dúvida. Porque uma coisa é estar lá em Brasília e claro que, no setor energético, são homens casados e tem filhos, mas não vai atingir a famílias deles, nem os filhos nem os netos. E estão falando do povo de Altamira em termos de estatística: “o que são 30 mil pessoas em comparação com 200 milhões de brasileiras e brasileiros?” Agora essa estatística não funciona, porque essas 30 mil pessoas são crianças que eu conheço, são mulheres, são homens, são idosos que moram lá e tem o futuro comprometido. Não sabem o que vai acontecer. Então é muito fácil decretar, determinar, decidir coisas em relação a um povo que eu não conheço. São indígenas, são ribeirinhos, são migrantes, são quilombolas que tem aí. Tudo vai ser atingido. E esses migrantes que vieram também, nas décadas de 80 e 90, vieram pra cá e que estão vivendo aí. Altamira hoje é uma composição de todas as raças, línguas povos e nações. Tem o branco, tem o negro, tem o indígena, tem todos os tipos, descendentes de indígenas, descendentes de negro, tem os brancos que vieram do Sul, que são descendentes de alemão, de polaco, de italiano. Está todo mundo lá.

Prof. Dário: Altamira tem uma identidade cultural própria no Pará?

Dom Erwin: Altamira não tem mais isso. Não tem mais não. De paraense nunca teve. Não era nem uma cidade, vamos dizer assim, genuinamente paraense, porque foi fundada pelos nordestinos na época da borracha.

Prof. Dário: Nós sabemos que a sua luta ela gerou uma grande enorme polêmica com relação à posição de alguns conglomerados econômicos, inclusive, com ameaça e atentado à sua vida. Como é viver dessa maneira, tão amedrontado, no seu próprio lugar de trabalho, na sua vida pessoal e no seu trabalho episcopal? Como é viver essa realidade?

Dom Erwin: A data... desde 29 de junho de 2006 estou sob proteção policial da Polícia Militar do Pará, por decisão de Brasília, e não foi decisão daqui. O projeto é de Brasília. Isso já diz tudo. O governo decidiu que eu devo estar sob proteção policial. Dia e noite. (Não revelarei detalhes do que me disse Dom Erwin sobre a questão, pois esses dados não podem ser revelados por razões de segurança). Mesmo o próprio governo está preocupado, já que a nossa área é uma região muito conflitiva então não pode excluir taxativamente mais um atentado, mais uma morte, mas um assassinato. E já aconteceram tantos. Inclusive na casa onde eu vivo. Então o governo tomou essa precaução para não acontecer isso, no fim das contas ia ser notícia que ultrapassa a própria fronteira brasileira.

Prof. Dário: E como o senhor se sente? Como convive com isso?

Dom Erwin: Bem, eu não fiz algo de errado. Eu sempre me coloquei do lado do povo. Defendi a vida e a possibilidade de sobrevivência dos povos que lá estão. Estou convicto daquilo que falei, da minha posição, a que tomei não é equivocada, viu. Estou convicto que é isso mesmo. E nunca vou tirar uma palavra, uma vírgula, daquilo que falei. Nunca. Agora se a consequência é essa, tem duas possibilidades. Uma é “cair fora”. Agora, vou lhe dizer...

Prof. Dário: A Igreja não lhe pediu para sair do Xingu para preservar a sua vida?

Dom Erwin: Não. A Polícia é que fez essa proposta. Não é a Igreja. Em 2006, fizeram a proposta “o senhor não pode ser transferido?” Eu disse “posso, se eu pedir.” Mas não vou pedir. Porque é isso que eles querem. Iriam soltar fogos. É uma máfia, é um consórcio mínimo. Não é o povo de Altamira, não é. O povo que eu conheço lá, o povo que vive lá, que conheço há 45 anos desde que estou lá, esse povo está ao lado do bispo. E nunca tive nenhuma cisma a respeito disso. Pelo contrário, quando fui ameaçado colocaram faixas nas Igrejas até hoje, como “A sua dor é a nossa dor”, “Nós te amamos”. Nunca recebi tanta declaração de amor como depois disso, entende? Então eu vou dar as costas para esse povo por causa dos que querem isso? De jeito nenhum. Não vou, não. Se tiver que acontecer, paciência. Eu não procuro, não procuro. Eu quero viver.

Prof. Dário: O senhor está fazendo o papel de missionário...

Dom Erwin: Claro. O que eu vou fazer? Agora eu vou viver assim. A coisa impressionante é o seguinte: que a vítima está sendo presa e os sem-vergonha, os agressores, estão à solta. Inverteu a ordem. E não posso sair de casa a não ser acompanhado de policiais, mesmo atravessando a praça para ir para a Catedral, não tem nenhuma missa que reze sem eles. São muito mais piedosos ainda do que muitos, porque esses assistem uma vez, no dia de domingo, uma única missa, eles assistem duas, às vezes três missas. Para mim não é uma questão tão desagradável.

Prof. Dário: Isso lhe incomoda?

Dom Erwin: Incomoda porque você está cerceado em tua liberdade, é claro. E eu não tenho nada a esconder, mas em todo caso. E cada passo que dou, estou acompanhado. Eu me dou muito bem com eles (outros detalhes dos policiais que fazem a segurança pessoal de Dom Erwim não podem ser revelados). A gente se relaciona muito bem, são muito discretos. Não tenho nenhuma queixa deles.

Prof. Dário: O senhor escolheu pessoalmente esses policiais?

Dom Erwin: Não. Foi a Polícia que escolheu. Agora, esses policiais que tenho não podem ser requisitados para outra coisa. Você não pode viver eternamente com medo, com pavor, você fica refém de uma coisa que não fez. (Dom Erwin falou sobre a sua relação fraterna com eles e de todos os procedimentos de sua segurança pessoal, mas esses detalhes não podem ser revelados).

Prof. Dário: O senhor está na Diocese de Bragança, conhecendo um pouco de nossa realidade, através também do trabalho missionário das Irmãs Missionárias de Santa Teresinha. Deixe uma mensagem para os nossos leitores e para os nossos diocesanos.

Dom Erwin: Bem... Estou aqui e não invadi esse território (risos). O bispo está sabendo que eu fui convidado. E o que a gente diz pro povo é sempre a mesma coisa que Dom Luís (referindo-se a Dom Luís Ferrando, Bispo Diocesano de Bragança/PA) certamente também diz nos sermões dele. Que continuem na batalha, na luta por um mundo diferente. Acredito que outro mundo é possível, mas ele não cai do céu. O Reino de Deus está próximo, sim, mas existe também o nosso empenho. E o empenho não é só do bispo, do padre ou da irmã, o empenho é de todas as mulheres e homens que se dizem cristãos. Então, tem que lutar para esse mundo acontecer, esse mundo diferente que nós sonhamos de fraternidade, de solidariedade, de justiça e paz. É isso que nós esperamos. E isso depende também de cada uma e de cada um de nós, tanto em Bragança como no Xingu.

Prof. Dário: Muito obrigado, Dom Erwin Kräutler, pela entrevista. Fico muito honrado com essa entrevista e com a oportunidade que o senhor nos deu.

Dom Erwin: Muito obrigado também.

Traços biográficos

Dom Erwin Kräutler é austríaco, nascido em Koblach em 12.07.1939, missionário da Congregação do Preciosíssimo Sangue. Ordenado sacerdote em julho de 1965, foi enviado ao Brasil, mais precisamente ao Pará, onde seu tio Dom Eurico Kräutler já era bispo.

Chegou a Altamira em 21.12.1965, onde até hoje reside. Foi nomeado bispo por João Paulo II em 07.11.1980, coadjutor da Prelazia do Xingu. Em 02.09.1981 assumiu como bispo prelado do Xingu/PA, função até hoje exercida. Foi presidente do Conselho Indigenista Missionário (1983-1991); membro da Comissão Episcopal de Pastoral da CNBB, responsável pela dimensão missionária (1995-1998).

Dom Erwin atuou com a irmã Dorothy Stang e prossegue na mesma luta pelos direitos das comunidades camponesas e indígenas e pela preservação ambiental na região amazônica; denunciou a exploração sexual de adolescentes por políticos; denunciou a emasculação e assassinato de meninos no estado; vem denunciando a atuação de latifundiários, grileiros, madeireiros e fazendeiros com práticas de trabalho escravo e de destruição ambiental; tem aberto espaço na sua diocese para o debate sobre a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, que ameaça atingir comunidades indígenas e camponesas, mas, segundo ele, é de interesse de madeireiros e grandes empresários.

Segundo o bispo, é comum ouvir em Altamira que, enquanto ele viver, a usina não sai. Ele também acredita que há pessoas diretamente ligadas ao assassinato da irmã Dorothy que também estão envolvidos no empreendimento. Dom Erwin vem sendo ameaçado e agredido inúmeras vezes há muitos anos devido à sua atuação. Em 1987, um suspeito acidente de carro quase lhe tirou a vida numa rodovia, ceifando a vida do Padre Salvatore Deiana, que o acompanhava. Suspeita-se que este acidente tenha sido forjado. Atualmente, Dom Erwin Krautler é presidente do Cimi (Conselho Indigenista Missionário) e vive sob a proteção de policiais militares do Estado.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Uma caracterização histórica de Bragança

Atendendo aos pedidos de diversos amigos e, especialmente de ex-alunos, que se preparam para o Concurso Público da Prefeitura Municipal de Bragança em 2011, publico abaixo uma Caracterização Histórica do Município de Bragança*, reunida a partir de vários estudos já publicados em diversos materiais, fontes e obras consultadas, minhas e de outros autores. Pela falta de espaço, resumi partes do texto e espero que esse material sirva aos objetivos e perspectivas de todos.
CARACTERIZAÇÃO HISTÓRICA DO MUNICÍPIO DE BRAGANÇA/PA[i]
Prof. M.Sc. Dário Benedito Rodrigues Nonato da Silva[ii]
Segundo estudos históricos e relatos, foram os franceses os primeiros europeus possivelmente a 08 de julho de 1613, numa exploração marítima de reconhecimento e conquista das terras da América, investigaram o litoral paraense. Porém, existem controvérsias sobre a indicação oficial dessa data, segundo diário dos jesuítas que acompanhavam Daniel de La Touche em sua viagem do Maranhão ao Pará.
Essas origens históricas de Bragança remontam ao início da colonização portuguesa no Pará, inserido no processo de conquista, entre tantas lutas que os lusitanos travaram contra estrangeiros e nativos para a manutenção do controle, posse e direito sobre o território. Neste período, a região que se tornou nos dias atuais a cidade de Bragança fez parte de uma estratégia da Coroa para garantir ao Estado português a sua ocupação, passando a ser, por volta de 1677 um assentamento de imigrantes açorianos que, na época, buscavam a esperança numa terra nova.
Arthur Cézar Ferreira Reis (1972) noticiou que os primeiros europeus a fazerem o reconhecimento da área foram os franceses em uma expedição chefiada por Daniel de La Touche, senhor de La Ravardière composta por homens cultos, como cientistas, geógrafos, botânicos. Teriam explorado o local três anos antes de Francisco Caldeira Castelo Branco, com a intenção de estender suas conquistas, pois já se encontravam estabelecidos no Maranhão e em terras da Guiana. A expedição tinha como comandante Charles des Vaux e permaneceu cerca de um mês às margens do rio Caeté. Somente em 1616, comandados por Castelo Branco, os portugueses chegaram ao local que hoje é a cidade de Belém, capital do Estado do Pará.
Por volta de abril daquele mesmo ano, Caldeira Castelo Branco comandava soldados e índios na construção do Forte do Presépio, às margens do rio Guamá, quando soube da invasão de navios holandeses nas cercanias do forte. Uma forte ação liderada por Pedro Teixeira conseguiu afundar um desses navios.
O comandante pediu auxílio à Coroa, ao Governador do Estado do Brasil, Gaspar de Souza e Capitão-Mor do Maranhão, Jeronymo de Albuquerque, enviando-lhes a notícia sobre a situação encontrada. Para Portugal mandou um navio e para o Maranhão ordenou uma comitiva capitaneada por Pedro Teixeira e Antônio da Costa, que seguiram por terra, escoltados por dois soldados e trinta nativos conhecedores do caminho. Segundo Ernesto Cruz (1955), a comitiva de Pedro Teixeira margeou o rio Guamá até chegar à nascente onde se encontra a cidade de Ourém, passando por terras da atual região bragantina até alcançar a costa às proximidades do rio Turiaçu, no Maranhão.
Foi nesse percurso que Teixeira e sua comitiva tiveram o primeiro contato com o povo que mais tarde faria parte da formação de Bragança: a tribo dos caetés, da poderosa nação Tupinambá. Uma situação nada amigável, já que Baena (1969) conta que os índios tentaram eliminar a comitiva e seu comandante, porém o armamento português, aliado à hostilidade natural entre as tribos que habitavam a região, foi determinante na vitória dos portugueses. Após a batalha, segundo os historiadores, os que sobreviveram se submeteram ao poder do homem branco.
O caminho percorrido por Pedro Teixeira provavelmente já poderia existir como uma trilha usada pelos índios, já que estes guiaram o alferes e seus companheiros. Presume-se, pois, que a comunicação entre Belém e São Luís por algum tempo tenha sido feita por este caminho.
O Atlas Digital da América Lusa informa que a então Capitania do Caeté foi doada por Filipe III (de Portugal) a Gaspar de Souza, ex-governador geral do Brasil, em 9 de fevereiro de 1622, como recompensa pela expulsão dos franceses do território. A confirmação dessa doação é uma carta de 21 de maio de 1739, onde constam documentos antigos em seus anexos. Este território iam do rio Turi (Açu) até o rio Caeté.
A Coroa decidiu, em 1618, transformar o Maranhão e Grão-Pará em Estado independente devido à extrema dificuldade de comunicação desta região com o Governo Geral do Brasil, instalado na Bahia. Com isso, ficou demarcado que as divisas do novo Estado iriam do Ceará à fronteira setentrional ainda indefinida do Pará. Francisco Coelho de Carvalho foi seu primeiro governador, assumindo o cargo no ano de 1626 em São Luís. Cumpriu um mandato de dez anos (1626-1636), período em que o Estado do Maranhão foi dividido em várias Capitanias hereditárias.
Segundo Heraldo Maués (1969), quando o governador Francisco Coelho de Carvalho veio ao Pará em 1627, ao passar pelo rio Gurupi, desembarcou e estabeleceu os fundamentos de uma povoação cujo nome era Vera Cruz do Gurupi, onde estabeleceu 60 colonos que viajavam com ele. Logo após, deu continuidade à sua viagem até Belém por terra, havendo a hipótese de que teria seguido o mesmo caminho de Pedro Teixeira.
Francisco Coelho de Carvalho teria gostado tanto da região que fundara a povoação que a transformou em capitania, com o nome de Gurupi, doando-a a seu filho, Feliciano Coelho de Carvalho. O rei Felipe III não confirmou, porém, a doação para Francisco Coelho. Em 1633, o filho mais velho de Gaspar de Souza, Álvaro de Souza, resolveu se apossar das terras a que tinha direito por herança e escolheu o sítio que ficava entre o rio Turiaçu e Quatipuru, o que coincidia com o território da Capitania do Gurupi. A nova capitania passou a ser chamada de Caeté.
O primeiro núcleo populacional da colonização na região do rio Caeté (ou Caité = caa + y + eté = mato bom, verdadeiro, na língua tupi), buscou firmar a tentativa de controle e dominação nas áreas da União Ibérica na América, com o nome de Vila Sousa do Caeté. Muitos anos depois, o antigo povoado ficou conhecido como Vila que-era.
O primeiro donatário do Caeté nomeou João de Herrera da Fonseca como seu lugar-tenente e primeiro capitão-mor. Para garantir o progresso da capitania, Herrera providenciou a transferência de aldeias inteiras para as cercanias do povoado. Prova disto é a existência de uma carta do Rei, datada de 1644 (da Coleção de Cartas Régias publicadas pelos Anais da Biblioteca e Arquivo Público do Pará), permitindo que Álvaro de Souza levasse índios para sua capitania.
Outra notícia desta capitania é encontrada em Leite (1943), dando conta de que entre 1674 e 1698, o donatário do Caeté resolveu fazer a transferência da sede das margens do Gurupi para a margem direita do Caeté, alterando o nome de Vera Cruz para Souza do Caeté. Esse período é mencionado por Serafim Leite que não especifica a data da instalação da Vila Souza do Caeté e não menciona o responsável pela mudança. Ernesto Cruz (1955) comenta a possibilidade de ter sido feita na administração de João de Herrera.
Embora o sistema de Capitanias não tenha dado muito certo, os donatários da Capitania do Caeté lutaram por algum tempo para mantê-la. Ernesto Cruz (1955) acredita que em seu início tenha sido prospera, mas com o passar o tempo a falta de colonos e as extremas dificuldades enfrentadas causaram sua falência. Pela Ordem Régia de 14 de junho de 1753, o governador Mendonça Furtado a reverteu para a Coroa após mais de um século sob o domínio da família Souza.
A partir de 1751, com a administração do Marquês de Pombal, a história toma novos rumos e a Província do Maranhão e Grão-Pará entra em novo período, chamado por Arthur Cézar Ferreira Reis de Ciclo Pombalino.
Uma das principais providências do novo ministro para a Amazônia foi transferir a capital de São Luís para Belém, criando a Província do Grão-Pará e Maranhão, combatendo o “sub-aproveitamento e/ou desperdício de suas potencialidades econômicas, devido à completa ausência de um projeto político de base cientifica” (SOUZA JÚNIOR, 2001, p. 37).
Em seguida, nomeou seu irmão ara ser o primeiro governador, Francisco Xavier de Mendonça Furtado. Entrava em vigor uma experiência moderna de colonização mediante o assentamento de famílias, visando à defesa do território e à povoação das localidades por meio do incentivo à formação de famílias constituídas por brancos e índios com o objetivo de fortalecer os laços portugueses nas novas terras.
Para executar as novas ordens, Mendonça Furtado “procedeu a uma revisão integral dos padrões de vida” (REIS, 1972, p. 59), visitando todas as povoações e elevando à categoria de vila antigos aldeamentos missionários que tinham potencialidades para sobreviver. Todas as Capitanias hereditárias abandonadas ou falidas foram reincorporadas ao patrimônio real. A Capitania do Caeté foi uma delas.
Quando passou pela área do Salgado em 1753, o governador entendeu que seria necessária a intervenção estatal na revitalização da região, pois as salinas do litoral que estavam sendo exploradas pelos jesuítas poderiam acrescentar recursos aos cofres da Coroa. Segundo Cruz (1955), o governador teria atribuído a decadência da Capitania aos constantes conflitos entre colonos e missionários provocados pela escravização indígena.
Iniciou os trabalhos de revigoramento, primeiramente transferindo o povoado para a margem esquerda do rio Caeté, elevando-o à categoria de vila, que denominou Vila de Nossa Senhora do Rosário de Bragança. Mandou implementar melhorias, como a construção de residências para novos colonos e a plantação de duas grandes roças à custa do Tesouro Real, onde seriam cultivados a mandioca e alguns legumes possíveis. Como na época, a comunicação com Belém pelo mar era difícil, mandou abrir uma estrada que ia da nascente do Caeté até a Casa Forte no Rio Guamá, onde hoje é Ourém, para facilitar o transporte da produção dos colonos para Belém. Também proveu o porto do Caeté com canoas, para que os colonos fossem pelo rio até sua cabeceira e de lá seguissem pela nova estrada. O governo também providenciou, nas proximidades da Casa Forte, a abertura de um estabelecimento de ensino da Língua Portuguesa aos jovens.
Apesar de todos esses esforços feitos para deslocar os colonos para a região, até mesmo a tentativa de transformar degredados em colonos na resultou em uma presença portuguesa significativa. O maior desafio de Pombal foi tentar resolver a situação dos nativos, que viviam entre os trabalhos impostos pelos colonizadores e a fuga para as aldeias dos missionários jesuítas em busca de proteção. Esses padres lutaram abertamente contra os colonos nas suas pretensões de escravização da mão-de-obra indígena. Com isto, os povoados se esvaziavam e não progrediam.
A política indianista aplicada primeiramente na Amazônia e estendida ao restante do Brasil implicava na transformação do índio em cidadão do Reino português, tirando-o da condição de escravo e dando-lhe o status de homem livre, utilizando estratégias como a obrigatoriedade do ensino da Língua Portuguesa, a regulamentação do trabalho indígena, a transformação das aldeias em vilas, a aceitação do índio no serviço militar, o estímulo do casamento do entre índios e colonos, a proibição da habitação coletiva separando as famílias em residências, a obrigatoriedade em acrescentar ao nome do índio um sobrenome português e a introdução de colonos em povoações indígenas.
Entretanto, essa empreitada não foi fácil para o novo governo. Mendonça Furtado enfrentou alguns problemas com os missionários, desta vez os do Caeté, que segundo Ernesto Cruz (1955), tentaram, por todos os meios que lhes alcançavam. Impedir a restauração da vila. Nessa peleja, o padre teria chegado a insultar o Ouvidor-Geral, que esteve na região para observar o trabalho de abertura da estrada entre a nascente do Caeté e a Casa Forte do Guamá. Como conseqüência daquela atitude, o governador mandou instalar na vila de Bragança uma guarda militar comandada pelo Tenente Inácio de Castro Sarmento, que, além de manter a ordem, tinha a missão de arrecadar os dízimos das salinas e pescados da região.
O Grão-Pará foi o primeiro estado a receber imigrantes açorianos, no início de 1677, para o desenvolvimento da região em atividades próprias das experiências que já realizavam sob o signo da colonização portuguesa. No Pará, podem ser citadas a pesca e a agricultura, atividades que até os dias atuais são largamente exercidas em Bragança e região. Segundo César Pereira (1963), os açorianos trouxeram sua cultura e procuraram imprimi-la em seu quotidiano, nas novas terras ocupadas.
Apesar de todas as dificuldades, o trabalho escravo negro, aos poucos, foi substituindo a mão-de-obra indígena, intensificando-se a partir da segunda metade do século XVIII, quando os navios negreiros aportavam em Belém. Isto foi facilitado com a criação da Companhia Geral do Comércio do Grão-Pará e Maranhão em 1755. Em Bragança, a exemplo do que ocorreu em outras localidades, o escravo negro foi empregado como auxiliar na lavoura, concorrendo para que a cidade se tornasse um entreposto entre São Luís e Belém.
Somente em 1854, através da Resolução de n.º 252, de 02 de outubro, a vila tornou-se cidade, por determinação do Presidente da Província, tenente-coronel Sebastião do Rego Barros, com o nome de Bragança.
Bragança é uma das cidades mais importantes da Zona Bragantina, referenciando-se pela população hospitaleira, o comércio, a agricultura, a organização socioeconômica e sua posição geográfica entre o Pará e o Maranhão. Antes da implantação da Estrada de Ferro de Bragança, em 1908, as relações com Belém e São Luís eram feitas através de viagens marítimas, demoradas e perigosas; ou então pela via do Guamá, onde metade da viagem era feita por terra, a pé ou a cavalo, a outra metade em embarcações, rio abaixo, até a cidade de Belém. Anos mais tarde, esse trajeto foi feito em pequenos navios da Companhia Costeira do Maranhão. Por essa circunstância criou-se em Bragança uma sociedade estável devido às relações comerciais com a capital do Estado do Maranhão.
A população bragantina desenvolveu-se a custa dos três grandes elementos étnicos: o branco, o índio e o negro. A maior parte da população hodierna mestiçou com a indígena se integrando à civilização cristã, dando origem à população cabocla. A diversificação de hábitos materiais, espirituais e de um modo geral culturais, é uma conseqüência da miscigenação entre branco e índio, formando um outro padrão de vida. Elucida-se que, o elemento branco colonizador de Bragança, foi aquele constituído por trinta casais açorianos enviados pelo governador Mendonça Furtado. A população indígena era formada por elementos da nação Tupi, já citada anteriormente.
Entre 1897 e 1900 verificou-se nova imigração de europeus, desta feita com os espanhóis, em número de 956 colonos, localizando-se na Colônia Agrícola Benjamin Constant, no distrito de Tijoca. O negro em grande percentagem ofereceu sua contribuição com os traços dominantes da língua, costumes e crendices. Nota-se também a presença de migrantes nordestinos advindos para o trabalho nos seringais e nas demais regiões, como a do Almoço, Montenegro e dos Campos.
A história da Região Bragantina confunde-se com a história da Estrada de Ferro de Bragança a Belém. Tanto que o crescimento percebido, tanto social como cultural e econômico veio através do trem. Outro fator importante na construção das ferrovias foi a possibilidade de unir por via terrestre grandes extensões territoriais, ligando regiões que até então se encontravam isoladas, possibilitando o escoamento de produção agrícola e favorecendo o surgimento de novas cidades, suscitando assim uma especulação imobiliária.
A Estrada de Ferro é um marco histórico na vida de Bragança, daí porque ela serve de baliza no tempo, na periodização da história do mundo caeteuara. Alguns historiadores, como Ubiratan Rosário (2000) distinguem nitidamente três fases:
1ª) Fase pré-ferroviária (período de formação) que vai de 1613, com a chegada dos colonizadores europeus, no Caeté, até 1908, implantação e término da ferrovia, num período que envolve a lenta fase, da Colônia, do Império e da República Velha até os primeiros anos do século XX, quando Bragança passou por um crescimento organizado e encabeçado pelo governo do Major Antônio da Costa Rodrigues.
2ª) Fase ferroviária (período do conhecido e suposto auge e da maturação) que vai de 1908, com a instalação da Estrada de Ferro de Bragança até 1966, quando por ato do governo militar fica extinta a ferrovia, interrompendo esse ciclo como fim do primeiro despertar bragantino.
3ª) Fase pós-ferroviária (período de mutação) que provocou inicialmente certa depressão, com ameaças de decadência, com perdas de funções econômicas e políticas, com retração de seu território municipal e de tensão nos espaços da comunidade caeteuara, além da mitificação da Estrada de Ferro como símbolo da modernidade e do enriquecimento da elite bragantina, ainda lembrado por muitos dos seus contemporâneos.
Bragança instituiu uma sociedade baseada na educação portuguesa, o que influenciou nos hábitos, costumes e na vida social de seus habitantes, observando-se, ainda hoje, tais padrões nos casarões revestidos de azulejos importados, com aspectos nitidamente lusitanos, obviamente instalados nas áreas urbanas privilegiadas, fortalecendo o caráter de camada (ou classe) superior da sociedade. Pode-se observar que a cidade no começo do século XX era um município próspero, organizado, com um setor comercial que já alcançava todos os ramos e estava prestes a ser ligada à ferrovia. Sua rua principal estava localizada onde hoje está o centro comercial, para onde afluíam as pessoas da cidade e do interior vender e comprar gêneros de todos os tipos.
A arquitetura de Bragança recorda a Belle-Époque no belíssimo Coreto Pavilhão Senador Antônio Lemos, inaugurado em 1910, quando também aparece o primeiro jornal do ciclo, “O Comércio”. Em 1911 inaugura-se o belo Mercado Municipal. A cultura local vai viver sua vertigem final nos anos 50, quando Armando Bordallo da Silva, à frente da Comissão Paraense de Folclore, leva de Belém a Bragança, a I Jornada Paraense de Folclore, realizada entre os dias 22 e 27 de dezembro de 1958.
Com o processo de expansão e urbanização, iniciado a partir de 1900, Bragança foi sofrendo a descentralização de sua população, com a construção de novas obras, acompanhando o surto de progresso que se estabelecera no município, o que deslocou para estes “novos bairros” a grande massa de nordestinos e colonos do interior. Tudo o que se destinava ao melhoramento das obras era gerido por um extenso, mas eficaz, Código de Posturas Municipais.
Construída com a finalidade de escoar a produção agrícola da Zona Bragantina para o consumo da capital e das áreas com mão-de-obra ocupada na extração da borracha exportada para a indústria automobilística internacional, a Estrada de Ferro de Bragança, como meio moderno e regular de transporte, assegurava a exportação e valorização dos produtos da roça, o que contribuía para o surgimento de uma classe endinheirada, capaz de financiar nas décadas de 20, de 30, de 40, e de 50 uma elite intelectual produtora de jornais e revistas, criadora de grêmios e associações recreativas e culturais, tudo como reflexo da opulência agrícola e comercial, a refletir-se na fachada dos casarões.
A sociedade bragantina, formada antes por índios, padres e colonos, depois por senhores, escravos e também padres, passou a ser, na fase ferroviária (1908-1966), a sociedade de proprietários de plantação e de “sítios”, sociedade de trabalhadores, caboclos – os “caboclos do sítio” – que eram, na verdade, os mais autênticos portadores do rico folclore bragantino, da Cavalhada à Marujada, do Boi-bumbá ao Xote, institucionalizadas pelas irmandades religiosas, enfatizando-se a do Glorioso São Benedito.
No seu auge ferroviário, essa sociedade integrava os lavradores, pescadores, comerciantes (enriquecidos com a evolução dos ciclos da borracha e da castanha-do-pará), conforme Maria de Nazaré Sarges (2002). Também doutores, médicos e advogados “aprovisionados” e outros que vieram graduados da capital. Homens ilustres chegam, tanto da capital quanto do vizinho Estado do Maranhão. Apareceram aí poetas, jornalistas, fazedores de jornais e revistas, bem como uma incipiente historiografia local, como a dos irmãos Bordallo da Silva, de Coutinho de Campos e de João Henrique de Araújo.
Depois do Lemismo do Laurismo, influenciaram a política bragantina o Baratismo e o Anti-baratismo. Das lideranças políticas dessa fase ferroviária, projetaram-se Augusto Corrêa (anti-baratista), Lobão da Silveira (baratista), que acabou senador pelo Partido Social Democrático, e ao qual caberia como destino no Senado, fazer o apelo desesperado em nome de seu município e em nome da Zona Bragantina, contra o projeto de extinção da Estrada de Ferro de Bragança. Devemos reconhecer que no período anterior à ferrovia, a sociedade não ficara alheia e incólume aos macro-eventos regionais da Amazônia, como a Cabanagem que também a envolveu.
De uma maneira geral, os habitantes desse município mantiveram suas características gerais: povo provinciano e não apegado a interesses comuns, mas particulares, o que quase sempre se apresentou na falta de conservação do nosso patrimônio histórico, cultural, arquitetônico e literário, na identificação e prática da cidadania, grande mal para a História recente e para a formação educacional de seu povo.
Pela Lei de n.º 658, de 31 de outubro de 1870, que motivava a construção da ferrovia, o governador concedeu incentivos às companhias que se interessassem em construí-la. Segundo Ernesto Cruz, a via férrea começaria no Marco de Pedra que assinalava a primeira légua patrimonial de Belém e terminaria na cidade de Bragança.
Bragança era o município mais populoso da microrregião bragantina. As migrações ocorreram com a construção da “Estrada de Ferro Belém-Bragança”, principalmente por grupos de nordestinos que aqui se concentravam; vindo muito depois os japoneses que se estabeleceram como introdutores da policultura. Com o censo populacional de 2000, o município de Bragança tinha cerca de 100 mil habitantes, sendo que 70% dos bragantinos vivem na cidade.
Iniciada em Belém, durante a Monarquia, em 1883, a Estrada de Ferro de Bragança chegou a Jambuaçu em 31 de dezembro de 1897; a Livramento em 9 de março de 1903. Em 1905, atingiu Igarapé-Açu. A Peixe-Boi dia 1º de março de 1907. A Capanema a 16 de novembro. A Quatipuru dia 24 de fevereiro. Finalmente a Bragança chega em 3 de maio de 1908. Daí estende-se até o Sapucaia em 9 de maio desse ano.
Atualmente, tem uma área de 2.090,234 km² e situa-se na mesorregião do Leste Paraense e microrregião Bragantina, que adota seu adjetivo pátrio numa zona de interseção entre o Pará e o Maranhão. Limita-se ao Norte com o Oceano Atlântico; ao Sul com os municípios de Santa Luzia do Pará e Viseu; a Leste pelo município de Augusto Corrêa e a Oeste pelos municípios de Tracuateua e Capanema. Segundo estimativas do IBGE (2006), a população é de aproximadamente 103.751 habitantes com densidade populacional de 49,6 hab/km².
Sua posição está a 30 metros de altitude em relação ao mar. Tem sua posição geográfica determinada pelo paralelo 01º03’17’ de Latitude Sul em sua interseção com o meridiano de 46º 45’54’ de Longitude Oeste (Greenwich).
A climatologia de Bragança obedece ao clima amazônico. No período de janeiro a maio, as chuvas prejudicam sensivelmente as culturas; de junho a agosto, o de maior normalidade para o cultivo e no período de setembro a dezembro, verifica-se o excesso de estiagem, o clima megatérmico e úmido. A temperatura média anual fica em torno de 26º C. De outubro a dezembro ocorrem temperaturas elevadas, registrando-se até máximas de 40º C. Os meses de março e abril são os mais frios, e em junho, normalmente, ocorrem baixas em torno de 14º C. A precipitação pluviométrica média anual é de 2.250 mm., sendo maior a concentração nos meses de fevereiro a abril (55%) e menor de agosto a dezembro (8%), com certo período seco de 3 a 4 meses. A umidade relativa do ar fica em torno de 80%.
A costa marítima é recortada por furos, baías e ilhas, onde deságuam inúmeros pequenos rios, importantes como fertilizadores e como vias de transporte, sendo principal o rio Caeté que nasce em Bonito com o nome de “Caetezinho”; atravessa Ourém, na Vila de Arraial do Caeté; passa por Santa Luzia cortando a Rodovia BR-316; atravessa a Rodovia Dom Eliseu, no km 30, Vila Mocajuba e assim sucessivamente, passando por Bragança até desaguar no Oceano Atlântico.
O rio Caeté sofre influência do movimento das marés. Seu desaguadouro apresenta uma sinuosidade e com pequenos trechos com pouca profundidade. Possui no território bragantino um trecho de aproximadamente 60 km navegáveis por embarcações de porte médio de até 200 toneladas. À margem esquerda, numa planície de pequeno declive, está situada a cidade de Bragança, 30 km distante do litoral, onde se encontra uma das mais belas praias do Brasil, Ajuruteua.
O litoral é constituído por uma baixa litorânea, costa lodosa cheia de reentrâncias e sujeita a inundações periódicas das marés. Encontram-se pequenos rios, originados de igarapés e furos, dentre os quais sobressaem: Tracuateua, Jejuí, Cajueiro, Urumajó, Quatipuru; as ilhas: Buiuçucanga, Mucum, Caeté e Ajuruteua, as praias: Ajuruteua, Maiau, Mucum.
O Município de Bragança apresenta como características gerais uma topografia de plana a ondulada, com grande tendência à erosão moderada, em limitado campo para plantação e impedimento à manutenção contínua da mecanização, por sua limitada possibilidade de nutrientes. Na zona campesina, surge um nível de colinas de topo aplainado, correspondendo aos tabuleiros da formação de barreiras com altitude média de 30 metros, onde se aprofundam seus vales.
Observam-se solos envelhecidos e fortemente ácidos de boa drenagem, permeáveis e de baixa fertilidade natural (latossolo amarelo) existindo ao norte, solos de baixadas inundáveis, pouco profundos e com características associadas ao encharcamento (solos indiscriminados de mangue) e também solos minerais predominantemente em desenvolvimento, provenientes da deposição fluvial e do arraste na Bacia Hidrográfica (solos hidromórficos e aluviais).
No início da conquista do território onde está hoje a cidade de Bragança, a vegetação florestal predominante era perenifólia, hidrófila, floresta amazônica de terra firme, profundamente modificada, em vista dos empreendimentos colonizadores da extinta Estrada de Ferro. Hoje, o que predomina é uma vegetação secundária com lavouras temporárias. No litoral, ocorrem densos manguezais e campos aluviais flúvio-marinhos, ocupados, principalmente pelo capim-de-maneca e por uma palmeira semelhante a babaçu; a noroeste da sede do município, os campos de Bragança. As espécies características da floresta densa são: acapu, tachi, açaí e pau mulato. A faixa litorânea e os baixos cursos são acompanhados continuamente por manguezais, até onde se faz sentir a influência das marés, regionalmente conhecida por apicum. Entre as principais espécies destacam-se o mangue vermelho e o mangue seriva ou siriúba.
A cultura exposta na história de Bragança se manifesta de forma mais acurada na celebração da Festividade do Glorioso São Benedito, organizada em 03 de setembro de 1798 e que se constitui como a maior contribuição de fé e cultura, de história e folclore do povo, em honra ao Santo Negro, iniciada pelos antigos escravos da vila, cujas datas principais são os dias que compreendem o período de 18 a 26 de dezembro, quando acontece a festa e a procissão solene.
Aliada a festa e não podendo dela ser desvencilhada, acontece a Marujada, que reúne rituais coreográficos como a Roda, o Retumbão, o Chorado, a Mazurca, o Xote, a Valsa, o Arrasta-pé e a Contra-dança. O que o quotidiano nega àquelas pessoas o tempo da festa proporciona, com certa posição de superioridade perante os demais, dando mais ênfase aos humildes. É o binômio festa e dança que permite a recriação, pelos marujos e marujas, da sua identidade de grupo social dentro de um sistema mais abrangente que é o conjunto da sociedade. É pela festa e pela dança que a presença da Marujada, cada vez mais marcante no cenário regional, se recria e retoma o amplo aspecto de dominação que a gerou e o espírito que a sustentou durante os mais de duzentos anos de história.
Os pontos mais visitados da cidade de Bragança estão ligados fortemente ao Centro Histórico e ao Largo de São Benedito. Todo o complexo, formado pela Igreja (construída por volta de 1753, de herança jesuíta, com traços barrocos na parte interna, abrigando a efígie de São Benedito, centro dos festejos da Marujada); Praça Fernando Guilhon, Prefeitura Municipal de Bragança (Palacete Augusto Corrêa, construção datada do início do século XX); Coreto Pavilhão Senador Antônio Lemos, trazido da Europa e montado em 1910, na administração do Intendente Antônio da Costa Rodrigues, no centro da Praça Antônio Pereira.
A seguir, uma tabela com os Desmembramentos Geográficos ocorridos a partir da criação da Capitania do Caeté até o Município de Bragança, com a legislação aplicada e os motivos geradores:

Desmembramentos geográficos ocorridos a partir da criação de Bragança

Ano
Lei / Decreto

Motivos

1852
Decreto Imperial n.º 639, de 12/06/1852.
Capitania do Caeté foi anexada à Província do Maranhão.
1856
Lei n.º 301, de 22 de dezembro de 1856.
Criação do Município de Viseu.
1879
Lei n.º 934, de 31 de julho de 1879.
Criação do Município de Quatipuru.
1955
Lei n.º 1227, de 11 de março de 1955.
Criação do Município de Urumajó (atualmente Augusto Corrêa).
1961
Lei n.º 2460, de 29 de dezembro de 1961.
Parte da área desmembrada para a composição do Município de Augusto Corrêa.
1991
Lei n.º 5688, de 13 de dezembro de 1991.
Parte da área desmembrada para a criação do Município de Santa Luzia do Pará.
1994
Lei n.º 5858, de 29 de setembro de 1994.
Parte da área desmembrada para a criação do Município de Tracuateua.
Fonte: IBGE
Referências Bibliográficas:
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[i] Parte componente da cartilha de NONATO DA SILVA, Dário Benedito Rodrigues. Uma História de Bragança sob novos olhares. Cartilha. Bragança: Prefeitura Municipal de Bragança / SEPLAN, 2008-2009.
[ii] Historiador e professor de História (UFPA 2002), Mestre em História Social da Amazônia (UFPA 2006), professor da UFPA Campus de Bragança.